Harmonização facial eleva a autoestima, mas pode trazer riscos aos pacientes

  • Bernardo Teixeira
  • Publicado em 1 de novembro de 2020 às 17:08
  • Modificado em 11 de janeiro de 2021 às 07:07
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Procedimento estético há alguns anos virou moda entre os famosos e, cada vez mais, vem se disseminando

Na era da disseminação das selfies, um rosto perfeito é o sonho de consumo de muitas pessoas. Fazer sumir aquela ruguinha que teima em aparecer, levantar a pontinha do nariz que aponta para baixo quando você sorri ou mesmo revitalizar a pele que deu aquela caída com o passar dos anos são apenas alguns dos anseios de quem se submete a uma harmonização facial.

O procedimento estético, já há alguns anos, virou moda entre os famosos e, cada vez mais, vem se disseminando entre anônimos. E nem a pandemia do novo coronavírus aplacou a vontade de melhorar aquilo que a genética deu a cada um. 

Basta dizer que, de março a outubro, a procura pelo termo teve um crescimento de 115% no Google, segundo levantamento da empresa de pesquisa e análise de comportamento digital Decode consultada pela agência “Folhapress”.

Mas, afinal, o que é a harmonização facial? O dermatologista Ivan Rollemberg, que tem entre os clientes de sua clínica na zona sul de São Paulo nomes como Grazi Massafera, Giovanna Antonelli, Wesley Safadão e o cantor sertanejo Mariano, que atualmente está em “A Fazenda 12”, é um dos especialistas que se destacaram neste conjunto de técnicas que visam buscar, como o próprio nome diz, uma harmonia maior para a face.

“Uma face harmônica depende de vários fatores”, explica o médico, que já realizou o procedimento em cerca de 2.000 pacientes. Ele diz que seu primeiro balizador é a proporção áurea, constante matemática que aparece em diversos elementos da natureza, inclusive no corpo humano, e é bastante utilizada nas artes desde a Antiguidade.

Porém, não basta fazer cálculos para se chegar a um resultado satisfatório e que vá funcionar para todos. “Não se trata de buscar uma simetria perfeita”, afirma. “As faces mais bonitas, do meu ponto de vista, não são necessariamente as que têm uma simetria perfeita, mas as que são mais equilibradas.”

O médico afirma que o conjunto de técnicas que envolvem a harmonização facial já existem há muitos anos. Elas podem envolver procedimentos invasivos (como lifting, rinoplastia e próteses). No entanto, os processos não-cirúrgicos são os que tem consquitado os brasileiros.

De fato, dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) apontam que procedimentos cirúrgicos e não-cirúrgicos já aparecem praticamente empatados nas clínicas de todo o Brasil. 

Em 2018, ano do último Censo realizado pela entidade, os não-cirúrgicos responderam por 49,9% de todos os procedimentos efetuados por cirurgiões plásticos no país. Em 2014, eles representavam apenas 17,4%.

Entre eles estão a aplicação de preenchedores (como o ácido hialurônico, com o qual é possível remodelar partes do rosto), da toxina botulínica (o famosos botox, que ameniza rugas de expressão ao bloquear o movimento do músculo) e dos esvaziadores (substâncias que promovem a diminuição da gordura), além dos fios de tração facial e lasers, entre outros.

Embora lembre que os médicos são proibidos de fazer publicações falando de valores ou mostrando os famosos “antes e depois”, Rollemberg aponta o advento das redes sociais como o principal impulsionador da harmonização facial. “Cresceu muito com os famosos mostrando grandes resultados na internet”, diz.

Ele aponta o clã das Kardashians como sendo o pioneiro nesta divulgação.

“Hoje em dia as pessoas trabalham mais e têm menos tempo, elas querem mais resultados com menos riscos. Temos também uma expectativa de vida maior, com relacionamentos durando cada vez menos e as pessoas querendo viver com a qualidade que merecem. E tem ainda a autonomia feminina, a igualdade de recursos. As mulheres foram as primeiras a aderir e depois trouxeram os namorados.”

Riscos e custos
Em teoria, qualquer pessoa que não tenha alergia ao produto que será aplicado pode se submeter à harmonização facial.

Rollemberg alerta, porém, que devem ser tomados cuidados especiais com os portadores de doenças autoimunes, pessoas com processos inflamatórios e aqueles que fazem uso de anticoagulantes. Além disso, menores de 18 anos devem ter a autorização dos pais.

Na clínica, ele diz que a maior parte dos pacientes são mulheres (65%), principalmente na faixa de 35 a 70 anos. Por causa da quarentena, o espaço ficou fechado por cerca de dois meses.

Após a reabertura, a procura foi alta. Ele calcula que dobrou com relação ao período anterior ao distanciamento social.

O médico conta que 99% dos pacientes o procuram para realizar a harmonização ou resolver algum outro problema relacionado à face. Ele diz indicar o que o paciente precisa após entender com ele qual o objetivo e se recusa a fazer qualquer procedimento que considere inadequado para aquele rosto.

Ele também adverte que, apesar de técnicas para que a sensação seja minimizada, alguns procedimentos pode causar dor durante a aplicação. O efeito pode ser percebido quase que imediatamente, mas inchaços e hematomas são relativamente comuns. 

O risco mais temido, no entanto, é a necrose (morte de algum tecido, se o problema não for rapidamente resolvido), motivo pelo qual recomenda-se procurar um profissional habilitado e de confiança (leia mais abaixo).

Normalmente, pode-se apreciar o resultado final depois de 3 a 7 dias. E, no caso dessas técnicas menos invasivas, a duração é, em média, de um ano. Depois, é preciso repetir o procedimento caso o paciente queira. 

Com relação ao custo do procedimento, é difícil precisar, já que cada paciente tem uma indicação diferente. Em geral, o custo é calculado a partir da quantidade de material usado no tratamento. Rollemberg diz que, na clínica dele, o paciente pode gastar entre R$ 900 (consulta) e R$ 50 mil (se quiser realizar todos os procedimentos disponíveis).

O Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) recomendam que os procedimentos sejam feitos apenas por cirurgiões plásticos e dermatologistas e alertam que esses procedimentos “equivocadamente conhecidos como não-invasivos, dando a impressão de simplicidade, não o são”. 

“A cirurgia plástica tem adotado a nomenclatura de procedimentos estéticos não-cirúrgicos, porque embora não sejam cirúrgicos, envolvem, sim, riscos, mesmo com médicos especialistas.”

O texto lista os seguintes riscos passíveis de acontecer caso os produtos sejam aplicados de forma errada e acabem indo parar na circulação sanguínea do paciente: choque anafilático (reação alérgica grave), reações urticariformes (lesões na pele), cicatrizes e deformidades, além de sequelas mais graves, como necrose e cegueira. 

“Quando acontece qualquer um desses problemas com outros profissionais que não médicos especialistas, o que ele faz é mandar urgente para um médico tratar”, afirma a entidade.

Contudo, o entendimento do Conselho Federal de Odontologia (CFO) é diferente. Em 2019, a entidade publicou uma resolução (que tem força de lei para a classe) reconhecendo a harmonização orofacial como especialidade odontológica e estabelecendo os critérios para regular a atuação dos cirurgiões-dentistas nesta área – em agosto deste ano, a entidade especificou que dentistas não estão aptos a fazer cirurgias como blefaroplastia, lifting de sobrancelhas e rinoplastia, entre outras.

Nenhuma das duas resoluções, no entanto, cita as aplicações de preenchedores e toxina botulínica, por exemplo. A disputa entre os dois conselhos foi parar na Justiça em 2017. 

O CFM e a SBCP pediram uma liminar para suspender a resolução do CFO, mas não foram atendidos nem na primeira nem na segunda instância. As entidades médicas estão recorrendo da decisão.


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