Sepse é doença que mais mata em UTIs no Brasil, de acordo com FAPESP

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 27 de novembro de 2017 às 01:17
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:27
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Com taxa de letalidade acima de 55%, problema já supera mortes por AVC e infarto no país

O Brasil tem uma taxa extremamente alta de morte por sepse, também conhecida como infecção generalizada ou septicemia, em UTIs, superando até mortes por acidente vascular cerebral e infarto nessas unidades. 

De acordo com levantamento organizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e do Instituto Latino Americano de Sepse (Ilas), a cada ano morrem mais de 230 mil pacientes adultos nas UTIs em decorrência da doença. A estimativa é sombria, 55,7% dos pacientes internados com sepse vão a óbito.

Os dados são do primeiro estudo nacional de pacientes com sepse atendidos em UTIs, que teve os resultados publicados na revista Lancet Infection Diseases. O trabalho é resultado de um projeto temático apoiado pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

A sepse é desencadeada por uma resposta desregulada do organismo na presença de um agente infeccioso. O sistema de defesa passa a combater não só esse agente, mas também o próprio organismo, gerando disfunção dos órgãos. Tanto as infecções de origem comunitária (40% dos casos) como aquelas associadas à assistência à saúde (60%) podem evoluir para sepse.

De acordo com médicos e pesquisadores, a prevalência de 30% de sepse não é considerada tão alta. Ela já havia sido identificada em estudos anteriores. Já a mortalidade por sepse no Brasil é altíssima, principalmente pelo fato de ser uma doença passível de prevenção em grande parte dos casos.

A vacinação pode prevenir sepse comunitária. As estratégias de controle de infecção hospitalar podem prevenir parte da sepse hospitalar. São medidas simples e a falta delas mostra que o sistema de atendimento à saúde não está bom.

O levantamento identificou que, embora a qualidade de atendimento varie muito de uma instituição a outra, não foi encontrada diferença significativa entre a taxa de mortalidade no sistema público (56%) e privado (55%). No geral, dos 420 mil casos tratados por ano, 230 mil terminam em morte.

Para chegar a esses dados, os pesquisadores dividiram as UTIs do país em 40 estratos, de acordo com fatores como região geoeconômica, tamanho das cidades e se as instituições eram públicas ou privadas. O resultado foi a coleta de dados de 227 instituições, ou 15% de todas as UTIs brasileiras.

Uma série de fatores leva ao resultado sombrio do tratamento da sepse nas UTIs brasileiras, como falta de acesso às UTIs, diagnóstico tardio, demora do paciente na busca por serviço de saúde, tratamento inadequado, problemas de processo e falta de recursos.

Vale ressaltar que a doença, quando detectada precocemente, é relativamente simples de ser tratada, necessitando basicamente da administração de antibióticos, fluidos e do monitoramento do paciente na UTI e da análise de cultura bacteriana.

Para evitar que uma parcela de pacientes seja excluída do tratamento intensivo, os pesquisadores defendem a necessidade de unidades intermediárias. Para eles, a ausência de unidades de cuidados intermédios na maioria dos hospitais brasileiros pode ter contribuído para uma maior permanência na UTI e, consequentemente, para uma maior prevalência de sepse.

É possível destacar ainda uma reação em cadeia desses fatores que agravam essa situação. Maus cuidados dispensados aos pacientes. O diagnóstico também é tardio, pois as pessoas procuram o hospital tarde, a detecção da sepse é tardia e o tratamento é inadequado. Com isso, a mortalidade é muito alta. 

Outro fator que contribui para os quadros de sepse são as altas taxas de infecção hospitalar devido à baixa adesão às medidas preventivas. De acordo com o estudo, a maioria dos pacientes que desenvolveu sepse apresentou infecção hospitalar.

De acordo com o estudo, a baixa qualidade dos cuidados nas unidades de internação regular limitaria as políticas de alta, bem como a provisão de suporte básico e monitoramento a pacientes de severidade leve a moderada. Outra causa possível da alta prevalência de sepse são as diferenças nos cuidados de fim de vida, como a quase ausência de tratamentos paliativos.

No Brasil, decisões de fim de vida são incomuns e existem lacunas na comunicação, escassez de regulação legal, ausência de diretrizes avançadas e crenças culturais e religiosas que podem resultar em esforços desnecessários para sustentar a vida, como descreveram os pesquisadores no artigo.

A incidência de sepse é um problema mundial, tanto que em maio deste ano a Organização Mundial da Saúde (OMS), braço da Organização das Nações Unidas (ONU), aprovou uma resolução para sepse.


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