Dia Mundial da Obesidade: data serve para comemorar ou para alertar sobre epidemia”

  • Roberto Pascoal
  • Publicado em 1 de setembro de 2023 às 15:00
  • Modificado em 1 de setembro de 2023 às 15:53
compartilhar no whatsapp compartilhar no telegram compartilhar no facebook compartilhar no linkedin

Caminho para combater esta realidade é o mesmo de sempre: comer de forma equilibrada e se exercitar

Novo medicamento surge como alternativa à cirurgia bariátrica

Caminho para combater esta realidade é o mesmo de sempre: comer de forma equilibrada e se exercitar

O Dia Mundial da Obesidade, celebrado anualmente em março, foi criado com o objetivo de incentivar hábitos saudáveis, como a prática de exercícios, uma alimentação equilibrada, um sono reparador e o emagrecimento saudável por meio de um tratamento multidisciplinar adequado e com profissionais especializados.

A obesidade afeta indivíduos de todas as idades e grupos sociais tanto nos países desenvolvidos como nos que estão em desenvolvimento, alcançando 650 milhões de pessoas no mundo inteiro.

Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a obesidade é um dos problemas mais graves de saúde que teremos de enfrentar no futuro. Em 2025, estima-se que 2,3 bilhões de adultos em todo o mundo estarão acima do peso.

No Brasil, a doença aumentou 72% na última década. Em 2006, eram 11,8% de obesos, e em 2019 esse percentual subiu para 20,3% da população.

Pesquisas da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica) constataram que no país a frequência de obesidade é semelhante em homens e mulheres, e que ela diminui com o aumento da escolaridade.

A obesidade é um dos principais fatores de risco para doenças não transmissíveis, como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, hipertensão, acidente vascular cerebral, várias formas de câncer, além de reduzir significativamente a qualidade de vida.

Outro dado alarmante é que as taxas de obesidade no mundo quase triplicaram desde 1975 e de lá para cá aumentaram quase cinco vezes entre crianças e adolescentes.

Considerada doença crônica, a obesidade tende a piorar com o passar dos anos, caso o paciente não seja submetido a um tratamento contínuo com profissionais qualificados. A OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública no mundo.

O tratamento inclui diminuição da ingestão de calorias e aumento da atividade física, podendo-se recorrer ao uso de medicamentos. Em casos mais graves, pode ser indicado tratamento cirúrgico.

A SBEM (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia) defende a criação de leis que possam restringir a comercialização de alimentos e bebidas com alto teor de gorduras, açúcar e sal para crianças; tributar bebidas açucaradas e proporcionar melhor acesso a alimentos saudáveis; criar espaços seguros para caminhadas, ciclismo e recreação nas cidades; ensinar às crianças hábitos saudáveis desde a infância, entre outros.

No tratamento multidisciplinar da obesidade podem se envolver profissionais de diferentes áreas: endocrinologia, nutrição, educação física e psicologia, todos especialistas em mudança de estilo de vida.

“A obesidade é doença complexa e que exige trabalho transdisciplinar”, constata a endocrinologista titulada pela SBEM e doutora pela USP, Cristina Schreiber.

Má qualidade nutricional

Para a nutricionista Tamara Gonçalves Maciel, a alimentação de um obeso muitas vezes está associada à quantidade aumentada de alimentos ingeridos e a porções acima do adequado. Porém, pode-se observar com maior frequência que a má qualidade nutricional atua como fator determinante.

A ingestão de bebidas açucaradas, como refrigerantes e sucos artificiais, e o consumo de alimentos ultraprocessados, como salgadinhos, bolachas recheadas, macarrão instantâneo, entre outros, que têm em sua composição açúcar, gordura e sal aumentados, impactam negativamente no estado de saúde e podem contribuir para o ganho de peso, pois concentram calorias em pequenas porções e, por possuírem baixo teor de fibras, não proporcionam saciedade, além de serem adicionados aditivos que viciam o paladar e dão aquele gostinho de quero mais.

O nutricionista é o profissional responsável por orientar a mudança de hábito alimentar focado principalmente na melhora da qualidade de vida e na prevenção de doenças associadas ao excesso de peso.

“É importante esclarecer que a obesidade não é escolha, não é questão de estética e não é falta de vontade ou força, mas uma questão de saúde!”, enfatiza Tamara.

Segundo ela, é possível trabalhar a mudança de estilo de vida em qualquer idade, porém os hábitos introduzidos na infância vão refletir no estado de saúde na vida adulta.

Por isso, o papel das famílias, principalmente no momento de introdução alimentar, é evitar ao máximo o consumo de alimentos ultraprocessados. E, mais importante ainda, os pais devem ser o exemplo, pois a criança só vai aprender a comer bem se eles consumirem alimentos saudáveis, compreendendo que esses alimentos são necessários para o crescimento e desenvolvimento adequado dos seus filhos.

Para Tamara, são vários os fatores que influenciam no aumento da obesidade em todo o mundo, entre eles o ritmo mais intenso de vida envolvendo a rotina de trabalho e a escassez de tempo para o lazer, para a prática de atividade física ou até mesmo para o preparo das refeições.

A nutricionista lembra que o acesso facilitado a alimentos prontos, como os fast foods, e o consumo de ultraprocessados aumentaram de forma significativa, sendo essa mudança relacionada principalmente à conveniência, praticidade e palatabilidade desses alimentos, enquanto as refeições caseiras preparadas com alimentos in natura ou minimamente processados (arroz, feijão, carnes, legumes e verduras), considerados essenciais para a alimentação adequada, reduziram.

Além disso, “existe um bombardeio de notícias sobre alimentação e dietas para emagrecer que, na maioria das vezes, trazem informações falsas e sem comprovação científica, tornando esse tema bastante confuso para quem busca melhorar os seus hábitos alimentares”, pontua Tamara.

Para ela, a base para uma boa nutrição está em se focar principalmente na qualidade da alimentação e o ajuste das quantidades; encarar os alimentos como nossa principal fonte de nutrientes (energia, vitaminas e minerais) e que por isso é importante ter uma alimentação variada com base em cereais integrais, leguminosas (feijões e grãos), legumes e verduras, frutas, leite e derivados com menor teor de gordura, carnes e peixes, e principalmente água para manter a hidratação.

Ela também sugere introduzir na sua rotina alimentos ricos em fibras, como aveia, granola, arroz integral, macarrão integral, pães variados de milho, aveia, batata, mandioca, além de grãos e sementes como linhaça, chia, abóbora e girassol para regular a saciedade e reduzir a vontade de comer alimentos mais calóricos.

Tamara explica que a constância é o que realmente importa. Uma refeição fora do plano alimentar não tem impacto tão negativo, mas um “dia inteiro comendo besteiras” ou várias refeições somadas ao longo da semana ultrapassam nossas necessidades e contribuem para o ganho de peso.

Fome física e fome emocional

A psicóloga Mérope Vedana, especialista em terapia cognitivo-comportamental, diz que para avaliar o comportamento do paciente é preciso identificar em cada indivíduo os fatores que contribuíram para a aquisição e manutenção da sua obesidade e criar estratégias que auxiliarão na conquista da redução de peso e em sua manutenção permanente.

“A psicologia tem demonstrado grande importância nesse sentido, visto que tem como papel tirar o foco da obesidade em si e olhar para o sujeito”, afirma.

Observa que outras características podem estar presentes na obesidade, como a impulsividade, a ansiedade e sintomas depressivos.

A terapia cognitivo-comportamental apresentou as primeiras evidências científicas nos anos 1960, no tratamento da depressão. A partir daí, as ferramentas para auxiliar na mudança de comportamento foram usadas nos tratamentos de ansiedade, pânico, fobias, transtornos de personalidade e alimentares.

Ela atribui esse crescimento da obesidade no mundo ao modo de vida que levamos, à correria do dia a dia, ao acesso imediato à informação e às condições do meio, que favorece a busca por fast foods e alimentos ultraprocessados.

Ela dá três orientações básicas para um obeso: observe seus pensamentos e sentimentos; tente diferenciar a fome emocional da fome física e lembre-se do provérbio chinês: ‘Coma a metade, ande o dobro e ria o triplo’.

Tratamento

A advogada de direito empresarial Jéssika Chielle, 31 anos, começou tratamento para obesidade em uma clínica especializada em outubro do ano passado e desde então eliminou 16 kg.

“Comecei a sentir o desconforto da obesidade, dores nas costas, indisposição, baixa produtividade no trabalho e falta de ânimo, minhas roupas já não serviam”, revela.

Ela tentou alguns modelos de dietas, mas não conseguiu se encaixar. Foi aí que chegou a um tratamento multidisciplinar. Seus exames clínicos ainda não estavam alterados, mas se continuasse engordando no ritmo em que estava isso impactaria sua saúde.

Jéssika acredita que o descontrole emocional contribuiu para que fosse perdendo o foco na saúde. Casou e passou a ter um dia a dia muito atarefado no trabalho, consumindo diariamente fast food e alimentos congelados e prontos. Mas quando iniciou tratamento com endocrinologista, nutricionista e personal trainer, a vida começou a mudar.

“A médica me ajudou a compreender a importância da perda de peso não apenas por estética, mas por causa da saúde. Por isso, as porções das refeições já diminuíram bastante e comecei a fazer escolhas mais conscientes, como mais frutas e verduras e comida de verdade, e não mais industrializada”, conta.

Hoje, Jéssika percebe a importância da atividade física. Seu metabolismo teve ótima resposta, bem como a disposição e autoestima. “Agora virei a chave, não tem mais volta. Os resultados do tratamento me trouxeram muitos benefícios e bem-estar, mas sem o suporte desses profissionais, não teria conseguido me manter na linha”, avalia.

Mudança de vida

O empresário Daniel Rodriguez, 42 anos, assim como Jéssika também decidiu ir atrás de tratamento para a obesidade.

Ele sempre foi um jovem ativo, mas depois do casamento e do excesso de trabalho tornou-se sedentário e passou a comer e beber excessivamente. Em maio de 2020, quando procurou ajuda, estava 35 kg acima do seu peso ideal.

“Eu não tinha mais disposição, estava sempre cansado, sem vontade de praticar atividade física, e o fato de algumas roupas não servirem mais também passou a me incomodar. Além disso, quando meu filho completado cinco anos, não tinha ânimo para brincar e correr com ele”, revela Daniel.

O empresário aderiu a uma dieta saudável e balanceada e adotou a prática de atividade física de 4 a 5 vezes por semana. Em seis meses, eliminou 30 kg.

Durante um tempo, Daniel ficou bem motivado, mas não conseguiu manter a disciplina e engordou de novo. “No período mais intenso da pandemia, deixei de praticar crossfit e acabei ganhando 15 kg novamente”, pontua.

Depois das festas de fim de ano e as férias, ele voltou a fazer futevôlei e crossfit, e está focado. Daniel acredita que, melhor do fazer uma dieta muito restritiva, é preciso optar por algo mais equilibrado, que possibilite perder peso gradualmente e de modo constante e permanente.

“Parece que a gente inicia a dieta e os convites para festas e jantares começam a aparecer com mais frequência. Por isso, agora na retomada do tratamento estou evitando essas saídas. Não quero desistir da dieta”, pontua.

Ele destaca a importância do acompanhamento médico e nutricional para ajudar a emagrecer com qualidade e saúde, diferentemente das fórmulas que fazem com que o indivíduo emagreça rapidamente, mas que prejudicam a saúde. Outro ponto positivo são as atividades físicas, como o muay thai, o crossfit e o futevôlei, e que sua única dificuldade é administrar melhor o tempo.

“A gente ouve muita gente falando que é só fechar a boca para emagrecer, mas não é tão simples assim, são muitas pressões sociais, da família e do trabalho que dificultam todo o processo”, explica. Daniel revela que uma abordagem mais humana e gentil, e que não agrida a autoestima do paciente, é fundamental para a adesão ao tratamento, assim como o apoio da família.


+ Boa Forma