Cientistas descobrem que saliva pode influenciar no sabor dos alimentos

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 25 de agosto de 2018 às 22:21
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 18:58
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Constatação feita por pesquisadores americanos pode ajudar no desenvolvimento de algumas intervenções

Proteger a boca das bactérias e lubrificar os alimentos para
facilitar a mastigação são funções da saliva. Pesquisadores americanos acabam
de identificar outra atribuição: o líquido também é responsável pelo
reconhecimento de sabores.

Os investigadores observaram o acúmulo de determinadas proteínas
salivares quando indivíduos ingeriram alimentos amargos e adstringentes. A
alteração gerou mudanças nas avaliações sensoriais, amenizando sabores
indigestos. Para a equipe, a descoberta pode ajudar no desenvolvimento de
abordagens que mudem hábitos alimentares, como “acostumar” a boca a gostos
considerados pouco agradáveis.

Detalhes do trabalho foram apresentados nesta semana, durante o
256º Encontro da Sociedade Americana de Química, realizado em Boston.

A pesquisa é um desdobramento de um estudo com
ratos, quando a equipe observou que uma dieta amarga altera a expressão de
proteínas na saliva dos roedores.

Os pesquisadores resolveram analisar se o mesmo
poderia ocorrer com humanos. Dessa forma, pediram que um grupo de indivíduos
bebesse leite de amêndoa com chocolate três vezes ao dia, durante uma semana.
Os participantes também tiveram que classificar o nível de amargura e
adstringência da bebida.

Pela análise do material, os cientistas perceberam
que a composição proteica da saliva dos participantes mudou durante o
experimento. Ricas no aminoácido prolina, as proteínas que se ligam aos
compostos que causam os sabores amargo e adstringente no chocolate aumentaram
com a ingestão do leite de amêndoa com chocolate.

Essas alterações corresponderam a mudanças nas
avaliações sensoriais dos participantes: à medida que essas proteínas
aumentaram, as avaliações sensoriais de amargura e adstringência diminuíram. “Acreditamos
que a saliva pode influenciar o paladar porque proteínas presentes nela podem
se ligar a moléculas que causam os sabores. Dessa forma, esses gostos ficam
‘presos’ na proteína salivar e não se encaixam mais nos receptores que detectam
essas sensações”, explica Cordelia Running, uma das autoras do estudo e
pesquisadora da Universidade de Purdue.

Os cientistas acreditam que essa é uma forma de o
corpo se adaptar para reduzir a “sensação negativa” provocada por alimentos
amargos e adstringentes. Com esses dados, eles acreditam que pode ser possível
estimular a expressão de proteínas salivares para que, com o tempo, alimentos
considerados de difícil ingestão se tornem mais atraentes ao paladar.
“Esperamos usar essas descobertas para ajudar as pessoas que evitam alimentos
amargos a mudar sua experiência com o sabor. Certamente, algumas pessoas gostam
de coisas como chocolate amargo ou chás adstringentes e vinhos, mas muitos
indivíduos evitam esses alimentos”, frisa Running.

Estímulo ao saudável

Para Patrícia de Castro Santos, nutricionista do
Instituto Castro Santos, em Brasília, e especialista em nutrição clínica e
esportiva, a abordagem poderá ajudar principalmente de pessoas que têm o hábito
de consumir doces e comidas ricas em carboidratos brancos. “A aceitação do
paladar é muito mais fácil para esses alimentos devido a altas concentrações de
açúcar. Sendo assim, a pesquisa indica que, se insistirmos no consumo de
alimentos com sabores menos adocicados e um pouco mais adstringentes ou
amargos, nos acostumaremos com eles e passaremos a aceitá-los”, frisa.

A nutricionista acredita que o estudo precisa ser
aprofundado para a confirmação dos dados e a busca por informações que melhor
expliquem a adaptação da saliva aos alimentos amargos. “Poderia ser pesquisado
quais compostos se ligam às proteínas e, consequentemente, mudam o sabor dos
alimentos; como podemos mudar a expressão dessas proteínas; e se haveria
alternativa para melhorar a aceitação de certos alimentos”, opina.

Cordelia Running conta que ela e a
equipe pretendem entender melhor os compostos de alimentos que provocam
alterações nas proteínas salivares. Também querem avaliar quanto tempo leva
para reduzir o gosto amargo das comidas e se imitadores de proteínas salivares
podem ser adicionados a alimentos para melhorar o sabor deles. “Queremos nos
aprofundar nas possibilidades de mudança de sabor. Vimos efeitos muito pequenos
no estudo atual e gostaríamos de observar se podemos maximizar isso”, adianta.


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