Cientistas traçam perfis de alcoólatras para personalizar tratamento

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 2 de dezembro de 2018 às 10:11
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:12
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Segundo especialistas, o detalhamento pode ajudar na criação de medidas para melhor tratamento e prevenção

O alcoolismo é um problema de saúde para diversos
países, e os efeitos do aumento da ingestão de bebidas alcoólicas tem feito com
que a doença seja alvo de cientistas, que buscam maneiras mais eficazes de
preveni-la e tratá-la. 

Para entender melhor como o vício pode afetar indivíduos
de formas distintas, uma americana analisou mais de mil voluntários e, com os
dados, traçou cinco perfis de indivíduos com o transtorno por uso de álcool.
Segundo Ashley N. Linden-Carmichael, os resultados podem gerar tratamentos mais
personalizados e eficientes. Os resultados do trabalho foram publicados na
revista especializada Alcohol and Alcoholism.

A autora do estudo destaca que o abuso de álcool é
mais complicado do que simplesmente “beber demais”. Trata-se de um grande
problema de saúde pública, que merece ser mais investigado. “Alguns bebedores
pesados preenchem os critérios para um transtorno por uso de álcool, mas, na
maioria das investigações anteriores sobre o tema, os pesquisadores se
concentraram apenas na gravidade dos sintomas. Eu e meu grupo estávamos
interessados em saber se existem diferentes tipos de ‘bebedores problema’ para
obter uma compreensão mais precisa, que pudesse ajudar em detecção e tratamento
precoces”, conta a pesquisadora em saúde biocomportamental e
professora da Universidade Estadual da Pensilvânia.

 Linden-Carmichael e sua equipe usaram dados
de 5.402 participantes do estudo chamado Pesquisa Nacional de Epidemiologia
sobre Álcool e Condições Relacionadas, realizado em 2016, nos Estados Unidos.
Para montar a amostra, a equipe considerou indivíduos com 18 a 64 anos e que
preenchessem os critérios para o diagnóstico de transtorno por uso de álcool no
ano anterior ao estudo (Veja infográfico).

Ao analisar os dados, a equipe chegou a grupos de
pessoas que compartilham sintomas similares de transtornos por uso de álcool. A
partir dessa informação, foram montados os perfis de bebedores problemáticos.
Segundo Linden-Carmichael, o método utilizado, desenvolvido no Centro de
Metodologia da Penn State, ajudou também a revelar a prevalência de alguns
perfis em diferentes idades.

Para a líder do estudo,  os profissionais de
saúde podem considerar a possibilidade de personalizar os tratamentos e os
esforços de intervenção tendo como base os dados da pesquisa. “Os terapeutas
poderiam considerar, por exemplo, que, em um jovem adulto, deve-se procurar
sintomas de abstinência. Por outro lado, em um público mais velho, é indicado
procurar pessoas que lutam para não ter ferimentos relacionados ao álcool.
Vimos essas características no trabalho”, ilustra.

Além dos manuais

Custódio Martins, psiquiatra do Instituto de
Neurociências de Brasília (INCB), destaca que o estudo americano revela
informações que se diferenciam de dados atuais na área médica relacionados ao
consumo de álcool. “É uma abordagem interessante, que foge das classificações
dos manuais atuais, mostrando dados de dependência diferentes dos conhecidos na
saúde mental”, compara.

Helena Moura, psiquiatra especialista em
dependência química, também acredita que o grande destaque da pesquisa é trazer
novas informações comportamentais relacionadas ao consumo de álcool. “Esse é um
tema que se discute há anos. Sabemos que nem todo alcoolista é igual. Por isso,
criar categorias para entender melhor os perfis é algo que pode nos ajudar.
Hoje, usamos 11 critérios para caracterizar as pessoas com esse tipo de
problema, mas esse estudo usa dados ainda mais detalhados”, diz.

Linden-Carmichael conta que pretende
usar o mesmo método em uma nova pesquisa, mas dando ênfase às diferenças
etárias. “Estou interessada em ver, por exemplo, o que acontece mais tarde com
alguém que tem um certo perfil em uma idade mais jovem”, exemplifica. “Se uma
pessoa está na classe de efeitos adversos apenas aos 21 anos, como estarão os
seus hábitos relacionados à bebida aos 60 anos? Eles aumentam ou diminuem de
velocidade? Se pudéssemos ter um estudo similar e maior e ainda seguir os
participantes durante seu envelhecimento, isso seria mais intuitivo e benéfico
para os resultados.”


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