A vitamina C pode mesmo ajudar na prevenção de gripes e resfriados?

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 19 de fevereiro de 2019 às 16:28
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:23
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Consumo em excesso de vitamina C pode fazer com que homens dobrem a chance de desenvolver pedra no rim

Não saia com o
cabelo molhado! Não brinque na chuva! Leva casaco pra não pegar sereno! Toma vitamina C!”. Todas essas frases certamente
já foram ditas ou ouvidas por muitos dos leitores. Fazem parte do senso comum
das pessoas de que, para evitar o
resfriado, seguir esses conselhos já é meio caminho andado. Mas
será que todos eles são baseados em evidências científicas? A vitamina C,
inclusive?

O C.S. Mott Children’s Hospital, um hospital
pediátrico vinculado à Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, encomenda,
de tempos em tempos, uma Pesquisa Nacional sobre Saúde Infantil (NPCH – sigla
em inglês). Esse tipo de estudo tem o objetivo de avaliar as percepções e
prioridades da opinião pública americana em relação a questões e tendências
importantes de assistência médica para crianças.

Em setembro de 2018, a NPCH levantou as estratégias
que os pais de crianças de 5 a 12 anos utilizam para que seus filhos não fiquem
resfriados. A pesquisa ouviu respostas de 1 119 pais, e os resultados foram os
seguintes:

Quase todos (99%) relataram o incentivo a uma boa
higiene pessoal, como lavar as mãos ou utilizar desinfetantes. Essa atitude é
consistente com as evidências científicas de como o vírus do resfriado costuma
se espalhar. Outro hábito ensinado pela ampla maioria dos pais (94%) é não
colocar as mãos perto da boca ou do nariz, e evitar compartilhar utensílios ou
bebidas com outras pessoas (94%).

Manter as crianças afastadas de quem já apresenta
sintomas de resfriado também teve um alto índice de adeptos, 87%. Alguns pais
(64%) foram além e relataram que pediam para parentes resfriados que não
abracem ou beijem seus filhos.

Uma minoria (31%) evita playgrounds na época em que
os resfriados são mais comuns. Muitos (84%) incorporaram a higienização do
ambiente do filho como uma estratégia para evitar resfriados.

Lembrando que o resfriado é causado por um vírus,
que se transmite com mais frequência de pessoa para pessoa. O mecanismo mais
comum é o vírus viajar embarcado em gotículas de muco e saliva que partem do
nariz ou da boca – os populares perdigotos – e que passam pelo contato
direto ou pelo ar, “decolando” num espirro ou numa tossida e pousando
diretamente na pele da “vítima”. Ou na superfície de maçanetas, torneiras,
mesas, brinquedos etc.

Portanto, todas as
atitudes mencionadas até aqui têm respaldo científico e são consideradas boas
práticas para evitar o resfriado, não só em crianças.

Mas e o cabelo molhado, a chuva, o sereno, a
vitamina C e demais suplementos de vitamina ou nutricionais?

Metade dos pais (51%) relataram dar aos filhos
produtos de saúde que podem ser comprados sem receita médica, como uma vitamina
ou suplemento, para evitar resfriados. A evidência de eficácia desses produtos
na prevenção do resfriado é pouca ou nenhuma.

O produto mais utilizado é a vitamina C (47%); menos frequentemente, os pais deram zinco (15%) ou Echinacea (11%), que é uma planta, também conhecida
como flor-de-cone, púrpura ou rudbéquia, muito utilizada como remédio caseiro.
Vendida em cápsulas ou chás.

Por volta de 25% dos pais deram para seus filhos
produtos infantis que prometiam “impulsionar” o sistema imunológico, seja lá o
que isso signifique.

Por fim, 70% dos pais relataram que tentam evitar
que as crianças peguem um resfriado seguindo as ditas “estratégias do
folclore”, que são baseadas no senso comum e sabedoria popular. Por exemplo,
52% dos pais relataram que dizem aos pequenos para não saírem com o cabelo
molhado, enquanto 48% disseram que incentivam os filhos a passar mais tempo
dentro de casa. Ironicamente, 23% dos pais encorajaram as crianças a gastar
mais tempo ao ar livre para evitar resfriados. “Tem que se sujar para pegar
imunidade”.

As estratégias do parágrafo anterior provavelmente
se iniciaram antes que soubéssemos que vírus eram a causa real do resfriado. Ao
longo da história, famílias tentaram muitas coisas para manter seus membros
saudáveis – algumas dessas coisas até foram eficazes – mas, no que diz respeito
à prevenção, passar mais tempo dentro de casa (ou ao ar livre), ou não ir lá
fora com o cabelo molhado não fazem mesmo muita diferença.

Em relação à vitamina C, a evidência positiva mais
convincente, até o momento, vem de uma revisão de 29 estudos, publicada em de
2013. Esses estudos tinham boa metodologia e envolveram mais de 11 mil
participantes. Os pesquisadores descobriram que, entre pessoas que praticam
exercícios de alta performance – como corredores de maratona, esquiadores e
tropas militares de elite – tomar pelo menos 200 mg de vitamina C todos os dias
poderia reduzir o risco de resfriado pela metade. Mas, para a
população em geral, tomar vitamina C diariamente não ajuda em nada a evitar a
doença.

No melhor dos cenários, tomar pelo menos 200 mg de
vitamina C por dia pareceu diminuir a duração dos sintomas do resfriado em uma
média de 8% em adultos e 14% em crianças, o que se traduz em cerca de um dia a
menos de mal-estar. Globalmente, isso até poderia fazer uma diferença, pois
estima-se que o resfriado cause 23 milhões de dias perdidos de trabalho por
ano.

O problema é oferecer esses suplementos para toda a
população mundial a um custo que seja menor do que o desses 23 milhões de dias
perdidos.

Além disso, a dose diária recomendada de vitamina C
para homens é de 90 mg. Para mulheres, o recomendado é 75 mg, e isso normalmente já vem na dieta, sem necessidade
de suplementação.

Alguns suplementos vitamínicos prometem entregar até
dez vezes mais que isso. Vale ressaltar que um estudo publicado em 2013 no JAMA
Internal Medicine (uma importante revista médica) mostrou que homens que
tomavam até 2 mil mg de vitamina C ao dia tinham o dobro de chance de
desenvolver pedra no rim.

Os responsáveis pela pesquisa do hospital sugerem
que as melhores estratégias para diminuir a propagação do vírus do
resfriado são não se esquecer de lavar as mãos e evitar contato direto com
pessoas doentes.


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