Espetáculo “O Navio Negreiro” é encenado neste domingo, 20, no Municipal

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  • Publicado em 23 de março de 2019 às 11:40
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:27
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Monólogo o Grupo BISV- Vado, de Campinas, tem entrada gratuita e integra o Festival Águas de Março

Vado apresenta o monólogo há mais de 45 anos (Foto: Reprodução)

​Franca recebe neste domingo, 24 de março, dentro do Festival “Águas de Março”, o espetáculo “O Navio Negreiro”, do Grupo BISV- Vado, de Campinas.

O Navio Negreiro é um poema de Castro Alves e um dos mais conhecidos da literatura brasileira. O poema descreve com imagens e expressões terríveis a situação dos africanos arrancados de suas terras, separados de suas famílias e tratados como animais nos navios negreiros que os traziam para ser propriedade de senhores e trabalhar sob as ordens dos feitores.

Foi escrito em São Paulo, no ano de 1869, quando o poeta tinha vinte e dois anos de idade, e quase vinte anos depois da promulgação da Lei Eusébio de Queirós, que proibiu o tráfico de escravos, em 4 de setembro de 1850. Já se passaram mais de 149 anos desde a criação do poema, mas sua história permanece sempre viva, principalmente nos palcos.

O ator Benedito Irivaldo de Souza, mais conhecido como Vado, encena a peça ‘O Navio Negreiro’, história adaptada por ele próprio e baseada no poema de Castro Alves, há mais de 46 anos. Tanto tempo em cartaz lhe garantiu recorde no Guinness Book, por carreira mais longa como produtor teatral pela mesma produção. “Ser um recordista mundial não é superar o outro, mas conseguir realizar os seus talentos no nível mais alto de sua existência”, comenta Vado.

TRAJETÓRIA DO ARTISTA

A estreia do monólogo aconteceu em 1971 quando o artista Benedito Irivaldo de Souza, o Vado então com 23 anos, fez a primeira apresentação de sua carreira. O plano era apresentar em 6 de julho, aniversário de morte de Castro Alves, mas a data foi postergada para outubro, aniversário de outro herói do jovem: Pelé. Entre o futebol e o teatro, porém, ele acabou escolhendo os palcos. Largou o time de base do Guarani para estudar artes cênicas nos Estados Unidos. “O negro lá tinha projeção maior”, explica.

Ser negro, conta o teatrólogo, foi a maior dificuldade de sua carreira, algo que a obra do próprio Castro Alves ajudou-o a vencer. “Ele, um irmão branco, nasceu na Bahia e amou seu povo, por que eu não?”, diz. Vado conta ainda que não guarda rancor daqueles que o julgaram por causa da cor. “Chegava para me apresentar nas escolas e os professores, quando me viam, mudavam de ideia… Mas eram outros tempos, o mundo era diferente: que atores negros o Brasil tinha?”, avalia.

Essa busca por uma identidade cultural levou Vado a aceitar o convite de um brigadeiro da Força Aérea Brasileira (FAB) para viajar o Brasil com o Exército. “Aprendi disciplina com eles, e também a ouvir críticas”, brinca, “eu era jovem e me achava o bom, mas faltava estrutura”. Depois, ainda em meados dos anos 70, Vado procurou por Chico Xavier que, segundo conta, incorporou o espírito de Castro Alves para que o próprio autor pudesse explicar a peça.

Em busca do recorde
Os anos se passaram e Vado foi acumulando apresentações: no Pelourinho, em Salvador (BA), no Ibirapuera e no Anhembi, em São Paulo (SP), no Maracanazinho, no Rio de Janeiro (RJ) e, principalmente, em escolas. A peça cresceu e o monólogo foi ampliado para conter 16 personagens, todos interpretados por ele, que falam da necessidade de amar o outro e até fazem críticas ao uso de entorpecentes, mensagens dirigidas para o público estudantil.

Nos anos 80, o intérprete conta que chegava a fazer quatro apresentações por dia. Para cortar custos e poder cobrar ingressos baratos, dispensava os técnicos e, usando um painel elétrico desenvolvido por um mágico que conheceu em uma viagem a Cuba, gerenciava até mesmo a iluminação da peça por conta própria.

Quando a peça chegou aos 30 anos de cartaz, após ter sido montada em inglês e espanhol, resolveu tentar o recorde. Os próximos dez anos se passaram em uma correria para encontrar a documentação, em papel timbrado, que comprovasse cada uma das apresentações. Amigos que trabalhavam do Museu de Imagem e Som (MIS) de Campinas e na Unicamp ajudaram, procurando registros. Conseguiu papéis comprovando 12 mil apresentações. E foi em 2012 que ele entrou para o Guinness World Records em 2012 como detentor dos títulos de “carreira mais longa como diretor de teatro de uma mesma produção” e também pelo maior número de apresentações de uma mesma peça. 

Hoje com 69 anos, Vado ainda viaja com o espetáculo por diferentes cidades e Estados.


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