Remédio para diabetes ajuda a proteger rins e coração dos pacientes

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 2 de dezembro de 2018 às 09:27
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:12
compartilhar no whatsapp compartilhar no telegram compartilhar no facebook compartilhar no linkedin

Testes em mais de 17 mil voluntários confirmaram benefícios alcançados com determinado tipo de medicamento

Prevenir e tratar doenças como
diabetes, insuficiência cardíaca e problemas renais crônicos de forma conjunta,
em uma abordagem holística: essa é a fórmula para um tratamento de sucesso. 

Pessoas com diabetes têm 33% mais chances de serem hospitalizadas por problemas
de coração e um a cada três pacientes sofre de doenças renais. Os dados
comprovam a necessidade de terapias integradas. “Temos de pensar no coração e
no rim como um casal. É uma relação conjugal. O rim é um órgão regulador e, se
algo estiver errado com ele, o coração fica infeliz. Eles vivem em um ambiente
integrado”, alerta o nefrologista George Barkis, professor da Universidade de
Chicago e diretor do Centro de Hipertensão da instituição.

Um estudo divulgado neste mês, durante o Congresso
da Associação Americana de Cardiologia, em Chicago, abre as portas para um
tratamento médico capaz de reduzir a glicose no sangue, além de proteger os
rins e o coração. 

A pesquisa realizada em 882 locais, de 33 países, com mais de
17,1 mil pacientes, durou cinco anos. A ideia inicial era cumprir um protocolo
de segurança para comprovar que a dapagliflozina, substância usada no
tratamento do diabetes, não oferecia riscos cardiovasculares. Mas os resultados
surpreenderam médicos e pesquisadores. Além de atestar a segurança da droga, o
levantamento indicou que o remédio protege os rins e previne a insuficiência
cardíaca.

A abrangência da atuação dessa classe de
medicamento veio à tona em 2015, com a divulgação de um estudo referente à
empagliflozina, outro inibidor de SGLT2, uma classe mais recente de remédios
para o diabetes. O levantamento mostrou benefícios cardiovasculares inesperados
pelos cientistas e pelos médicos e abriu uma nova fronteira na medicina. Os
estudos, a partir daí, se aprofundaram. Os objetivos eram saber se os
resultados se reproduziam e explicar seus mecanismos.

Os especialistas queriam descobrir como uma
medicação que foi criada para inibir o transporte de glicose no rim, de modo a
baixar a glicemia e controlar o diabetes, ajudava a reduzir a mortalidade dos
pacientes. Outra dúvida era se isso só acontecia com a empagliflozina ou se os
resultados se repetiriam com substâncias que têm ação semelhante. No segundo
estudo, com a canagliflozina, mais uma vez os médicos e pesquisadores verificaram
os benefícios como a proteção dos rins e a redução dos riscos de insuficiência
cardíaca.

Na pesquisa com a empagliflozina, só foram
admitidos pacientes que haviam enfrentado algum evento cardiovascular. Eram
diabéticos que haviam infartado ou tiveram derrame, por exemplo. Na pesquisa
com a canagliflozina, houve uma pequena proporção de pacientes que, além de
diabéticos, apresentavam múltiplos fatores de risco. No levantamento mais
recente, com a dapagliflozina, a maioria dos voluntários não tinha sofrido
evento cardiovascular. Eram diabéticos com mais um fator de risco, além da
idade.

A seleção mais abrangente de voluntários é a grande
diferença da pesquisa divulgada no congresso americano. “Os resultados são
semelhantes, tirando alguns detalhes. Em essência, o estudo confirmou que essa
classe de medicamentos tem efeito protetivo com relação à insuficiência
cardíaca, que é a principal complicação cardíaca do diabetes e a principal
causa de morte cardiovascular”, conta o endocrinologista Freddy Eliaschewitz,
diretor do Centro de Pesquisas Clínicas de São Paulo (CPClin).

No Brasil

O médico conduziu as pesquisas no Brasil, onde
estavam 326 dos 17,1 mil voluntários. “Houve um efeito preventivo, capaz de
evitar piora e reduzir a hospitalização. A gente ainda não sabe se há algum
efeito terapêutico para a insuficiência cardíaca, isso vai depender de estudos.
Mas a pesquisa demonstrou que a substância tem efeito protetor. Ela diminuiu
discretamente casos de infarto de miocárdio e demonstrou algo que era
totalmente inesperado, mas que, talvez, seja o mais importante, que é o efeito
protetor do rim. A dapagliflozina retarda o progresso da disfunção renal”,
explica Freddy.

“A gente dispõe de uma classe de medicamentos que
atende muitas necessidades e é capaz de prevenir a principal causa de morte
cardiovascular e a complicação microvascular mais temida, depois da cegueira,
que é o paciente necessitar de diálise e de transplante. É muito importante”,
argumenta o diretor do Centro de Pesquisas Clínicas de São Paulo. “Se alguém
tinha dúvida com relação à segurança da droga do ponto de vista cardiovascular,
ninguém mais tem. Não usá-la também é perder uma oportunidade de preservar o
rim. Isso tem uma tremenda importância”.

O endocrinologista Itamar Raz, professor de
medicina e diretor da Unidade de Diabetes da Universidade de Hadassah, em
Israel, também ressalta a importância da prevenção e do tratamento conjunto do
diabetes. “O mais importante é conhecer a doença e fazer o diagnóstico o quanto
antes. O segundo ponto é tratá-lo o mais rápido possível, para que o paciente
receba assistência antes de sofrer com insuficiência renal ou cardíaca”,
justifica o especialista. “É preciso agir em estágio bem precoce para evitar a
deterioração dos rins, do fígado e do coração”.


+ Ciência