STF pode estender isenção do IR a doentes graves ainda não aposentados

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 24 de setembro de 2018 às 08:47
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:02
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Restringir benefício fere princípios da dignidade humana e igualdade

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A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, protocolou no Supremo Tribunal Federal, nesta sexta-feira (21/9), ação de inconstitucionalidade – com pedido de liminar – a fim de que a isenção do imposto de renda conferida por dispositivo da Lei 7.713/1988 seja estendida aos rendimentos de todas as pessoas que sofrem das mesmas doenças graves previstas na antiga norma legal que permanecem “exercendo atividade laboral”. E não apenas a aposentados.

De acordo com a petição inicial da chefe do Ministério Público Federal, a concessão dessa isenção somente a “aposentados acometidos das doenças graves especificadas no dispositivo e, não, aos trabalhadores em atividade, afronta os princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1.º–III da Constituição), dos valores sociais do trabalho (art. 1.º–IV da Constituição) e da igualdade (art. 5.º–caput da Constituição)”.

Para justificar ainda mais o objeto da ADI 6.025, Raquel Dodge cita a “especial proteção constitucional conferida às pessoas com deficiência pela Constituição (…), e sedimentadas pela Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (também conhecida como Convenção de Nova York), que foi incorporada no ordenamento jurídico brasileiro com status de norma constitucional (de acordo com o rito do art. 5.º, parágrafo 3º da Constituição)”.

O dispositivo impugnado da lei de 1988 é o seguinte:

“Art. 6 º: Ficam isentos do imposto de renda os seguinte rendimentos percebidos por pessoas físicas: (…) XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004)”.

A procuradora-geral da República destaca ainda na petição:

– “Sabe-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que o Poder Judiciário não pode atuar como legislador positivo para estabelecer isenção de tributo não prevista em lei. Segundo a Corte, a extensão de benefícios isencionais pela via do Judiciário esbarra no princípio da separação dos poderes, já que ‘a concessão de isenção em matéria tributária traduz ato discricionário, que, fundado em juízo de conveniência e oportunidade do Poder Público (RE 157.228/SP), destina-se – a partir de critérios racionais, lógicos e impessoais estabelecidos de modo legítimo em norma legal – a implementar objetivos estatais nitidamente qualificados pela nota da extrafiscalidade’ (AI 360.461 AgR, relator o Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 28.3.2008)”.

– “Como disse o Ministro Celso de Mello no AI 360.461 AgR, a extrafiscalidade é instrumento legítimo à efetivação de objetivos sociais e de política governamental. A isenção fiscal, por sua vez, ‘decorre do implemento da política fiscal e econômica, pelo Estado, tendo em vista o interesse social’ (RE 157.228/SP, rel. o Ministro Paulo Brossard, DJ 3.6.1994).

A discricionariedade do ato que concede isenção fiscal, contudo, embora amparada em juízo de conveniência e oportunidade do Poder Executivo para a implementação de políticas fiscal, econômica e social, não pode se sobrepor a valores caros à sociedade, como os princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade e da inclusão das pessoas com deficiência – ou acometidas de alguma das doenças graves especificadas no art. 6.º–XIV da Lei n.º 7.713/1988 –, especialmente quando possuir elementos arbitrários ou não mais condizentes com a realidade social. A presença de características arbitrárias no conteúdo intrínseco da norma que culminem na outorga de privilégios estatais desproporcionais em favor de determinados contribuintes afronta o princípio constitucional da igualdade na lei, como se lê, a contrario sensu, do voto Ministro Celso de Mello no AI 360461 AgR”.

– “Na espécie, a isenção do imposto de renda conferida pelo inciso XIV do art. 6.º da Lei n.º 7.713/1988 apenas sobre os proventos percebidos por aposentados acometidos de determinadas doenças graves não está mais apoiada em fatores lógicos e objetivos que justifiquem o tratamento normativo diferenciado com relação aos rendimentos auferidos por pessoas que sofrem das mesmas doenças graves, mas que ainda permanecem exercendo atividade laboral”.


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