Desenvolvimento da fala da criança pode ter prejuízo com o isolamento

  • Bernardo Teixeira
  • Publicado em 27 de dezembro de 2020 às 17:56
  • Modificado em 11 de janeiro de 2021 às 12:49
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Alterações no sono e no comportamento também podem aparecer

O isolamento social – medida adotada para combater a propagação do novo coronavírus – pode trazer alguns prejuízos no desenvolvimento da fala e linguagem das crianças obrigadas a ficar em casa devido à pandemia, alertam especialistas. 

“Principalmente pela falta de estímulos ambientais e sociais que estavam anteriormente expostas, como por exemplo, na escola, saída com amigos e passeios em família”, explica a fonoaudióloga e especialista em linguagem Lilian Papis. 

Mesmo com a reabertura das escolas, muitos pequenos mantiveram sua rotina em casa com os pais trabalhando em home office ou sob os cuidados de outros adultos. 

Agora, com as férias escolares e o aumento do número de casos de covid-19, muitos pequenos voltarão a ficar exclusivamente em casa o que deve aumentar o uso de aparelhos eletrônicos como tablets, celulares ou computadores para distrair e entreter as crianças que acabam ficando privadas da comunicação verbal.

“Pode começar a haver atrasos no desenvolvimento oral, como também gráfico, dificuldades auditivas, tanto periféricas, pelo alto volume ou uso excessivo de fones de ouvido, como também de atenção e concentração e processamento auditivo central”, aponta a fonoaudióloga.

Os meses de quarentena em casa provocaram mudanças nos hábitos até mesmo das crianças que não tinha uma rotina escolar, pois os parques, clubes, praças e áreas de lazer foram fechados para evitar aglomerações.

Na avaliação da fonoaudióloga Lilian Papis, crianças que estão começando a falar, por volta de 1 ano ou que estão em pleno desenvolvimento de fala e linguagem, entre os 2 ou 3 anos, devem ser diariamente estimuladas através dos cinco sentidos, audição, visão, tato, olfato e paladar. 

“É primordial cantar músicas, brincar com miniaturas, fantoches, contar histórias, nomear figuras ou pedir para que as repita, falar frases relacionadas ao que estão comendo, apresentar diferentes sabores ao seu paladar e estimular o olfato através do cheiro da comida, frutas; imitar sons de animais, meios de transporte, objetos eletrodomésticos, brincar de fazer caretas, mandar beijos, estalar a língua também ajudam muito”, enumera Lilian.

Mesmo sem o convívio escolar, as brincadeiras em casa devem estimular a fala, recomenda a fonoaudióloga Lilian Papis. 

“Em casa as crianças precisam ser estimuladas todos os dias, pelo menos uma hora, com os pais ou responsáveis a brincar, cantar músicas, falar, estabelecer diálogos, conversar”, destaca a especialista.

“Para as crianças em fase de alfabetização, incentivar também brincadeiras que envolvam reconhecimento e nomeação das letras, relacionando-as com seus sons, brincar com rimas, memória auditiva, memória visual, quebra-cabeças, dama, xadrez, jogos que requeiram a atenção, como também a escrita das letras, sílabas e palavras. Para os maiores, além de tudo isso, acrescentar leitura de textos, livros, gibis, escrita de pequenos textos, jogos como forca, stop, caça-palavras, palavras cruzadas, dentre outros”, elenca Lilian.

Avanços
A especialista em linguagem Lilian Papis explica que a estimulação – tanto auditiva quanto visual – é benéfica para o desenvolvimento da fala e da linguagem infantil e que, nos aparelhos eletrônicos, os vídeos e desenhos são bem coloridos e estimulantes. 

“A criança aprende através de estímulos repetitivos e imitação, portanto em alguns casos isso pode ajudar, ou em outros prejudicar este desenvolvimento, pois existe a privação da necessidade de comunicação, de diálogo com a família, o que pode atrasar ou interferir neste processo, além de poder prejudicar o desenvolvimento da atenção e gráfico”. 

Lilian enfatiza que é importante saber dosar a quantidade de horas diárias que as crianças passam na frente das telas e estimular a brincadeira infantil, contação de histórias, rodas de conversas e jogos entre os familiares.

“Oriento ainda a estimular a criança sempre de frente para ela, na altura dos seus olhos para ter um adequado contato visual; não falar infantilizado; dar sempre um correto modelo de fala, não repetir o erro da criança, pois ela aprende a falar através da audição, repetição e imitação, mesmo que ela não consiga pronunciar a palavra corretamente, fale o certo. Ela deve ainda comer alimentos adequados para sua idade, pois a mastigação também é de extrema importância para o desenvolvimento da fala e linguagem”, acrescenta a especialista.

Mudanças de comportamento
Durante a infância, o cérebro da criança se desenvolve com muita rapidez gerando grandes aprendizados. Com a chegada da pandemia e o isolamento dos pequenos em casa, muitos estímulos necessários para a ampliação do desenvolvimento cognitivo infantil podem ter diminuído. 

Para especialistas, essa falta de contato com outras pessoas e de vivência fora de casa pode ter prejudicado não só a fala, mas trazido alterações no sono, no humor e no apetite das crianças.

“Não podemos desconsiderar os possíveis estressores ambientais que impactam nas crianças, sobre isso podemos pensar em mudança de rotina e novos papéis atribuídos aos pais, perda de familiares pela covid-19, mudanças estruturais como perda de emprego e pais com pouco manejo emocional”, destaca a psicóloga especialista em terapia cognitivo comportamental e neuropsicologia Roberta Alonso.

“As crianças têm apresentando humor mais irritado, alterações do sono e comportamentos de impaciência, assim como regressão em sua autonomia, sobrecarregando os pais”, completa a especialista.

A psicóloga sugere aos pais trabalhar as próprias emoções e expectativas. “As crianças estão em desenvolvimento e têm condições de retomar e melhorar suas habilidades quando começarmos a retomar a rotina em segurança. É importante pensar que a frustração também faz parte do desenvolvimento e esse período também está a ensinar isso”, afirma.


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