ANS faz campanha para evitar antecipação dos partos durante fim de ano

  • Cesar Colleti
  • Publicado em 4 de dezembro de 2018 às 14:29
  • Modificado em 8 de outubro de 2020 às 19:12
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Brasil tem cultura de agendamento de cesarianas por motivos não clínicos, o que aumenta risco para o bebê

Agência Nacional de Saúde Suplementar
(ANS) em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein e o Institute for
Healthcare Improvement (IHI) lançaram, na última semana, a campanha “A hora do
bebê: Pelo direito de nascer no tempo certo”, que tem como objetivo incentivar
o parto normal e conscientizar as futuras mães e toda a rede de atenção
obstétrica sobre os riscos da realização de cesáreas sem indicação clínica.

A campanha foi lançada perto do
início do mês de dezembro porque, segundo dados da ANS sobre partos realizados
por beneficiárias de plano de saúde, há redução de cesarianas no final de
dezembro e aumento no período anterior ao Natal. Os números mostram que há
antecipação dos nascimentos que ocorreriam na época das festas de fim de ano.

Agendamento
de partos

De acordo com a ANS, em 2017, a média
de cesarianas na semana de 24 a 31 de dezembro foi 20% menor do que a média
semanal do ano, enquanto a média entre 16 e 23 de dezembro foi 9% maior do que
a média anual. Isso indica agendamento dos partos que ocorreriam na semana
entre Natal e Ano Novo. Em 2016, houve diminuição de aproximadamente 40% no
número de cesáreas realizadas no período de 24 a 31 de dezembro, comparado com
a média semanal de cesarianas. 

Segundo a ANS, há evidências
científicas de que bebês nascidos de cesarianas são internados em UTI neonatal
com mais frequência e, quando não há indicação clínica, a cesariana pode
aumentar o risco de morte da mãe e as chances de complicações respiratórias
para o recém-nascido. Isto porque, se o parto for realizado antes das 39
semanas de gestação, o nascimento pode ocorrer sem a completa maturação
pulmonar do bebê, além de o trabalho de parto também completar o ciclo de
amadurecimento do bebê. 

Parto
natural

Além disso, a passagem pelo canal
vaginal, na hora do nascimento, coloca o bebê em contato com bactérias
naturalmente presentes nessa área do corpo da mulher, fortalecendo seu sistema
imunológico. O trabalho de parto completa o ciclo de amadurecimento do bebê: a
intensificação gradual das contrações musculares do corpo da mãe favorece a
prontidão para o nascimento e o contato com o mundo, uma vez que ritmo
cardíaco, fluxo sanguíneo e maturação pulmonar são gradativamente trabalhados
no corpo do bebê. 

Além disso, hormônios naturalmente atuantes durante o
trabalho de parto favorecem o vínculo entre mãe e bebê, o aleitamento materno e
a recuperação pós-parto. “Não há evidências que justifiquem o
agendamento de uma cesariana, salvo algum risco claro para a saúde da mãe e do
bebê. É importante que a gestante tenha o apoio de médicos, enfermeiros e demais
profissionais que acompanham o pré-natal, para entender as opções de parto e
fazer a escolha de forma consciente”, disse a especialista em regulação de
saúde suplementar e coordenadora do Projeto Parto Adequado, Jacqueline Torres.

Cultura
de agendamento

Segundo Jaqueline, o Brasil tem
uma cultura muito grande de agendamento de cesarianas por motivos não clínicos,
permitindo que isso aumente na época de festas de final de ano, justamente por
conta da mudança na rotina e por muitos profissionais saírem de férias. 
Ela reforçou que esse processo e seu agendamento são bastante comuns no Brasil
porque o sistema de saúde do país está organizado para produzir cesáreas, e a
forma como esse modelo foi desenhado estimula que os profissionais médicos
tenham que agendar as operações para conseguir fazer todos os partos.

“Nosso modelo de assistência foi
organizado de tal maneira que é muito difícil que a mulher consiga ter um parto
normal, porque ela se vincula a um único médico, que é responsável pelo
pré-natal e pelo parto, sem que ele tenha um apoio de uma rede de serviços,
como outros médicos, enfermeiras obstétricas. E isso impede o acompanhamento de
um evento que é tão incerto e não tem hora para acontecer”. 

Mudança
de modelo

Para Jaqueline, o que pode mudar esse
quadro são ações em várias frentes, começando por reorganizar o modelo de
cuidado, com multiprofissionais voltados para as práticas humanizadas, passando
pelo comprometimento dos hospitais com a mudança desse modelo e priorizando a
qualidade do atendimento à paciente. “Precisamos também dar mais
informações para as mulheres e permitir que elas opinem mais junto aos serviços
de saúde para melhorar a qualidade e a experiência de parto dessas
mulheres”.

Segundo ela, uma das maneiras de
convencer as futuras mães de que o melhor é não agendar as cesáreas para antes
ou depois do período de festas de final do ano, apenas para ter o feriado
livre, é esclarecer que, apesar de muitos resultados bons e felizes, acontecem
situações que a maioria das pessoas não conhecem.

“Acredito que nenhuma mãe vai
querer arriscar ter um filho na UTI neonatal, ou algum problema até mais grave
para o bebê, por conta de um feriado. Quando a mulher está bem informada,
ela faz escolhas melhores. Mas não adianta estar bem informada, se não encontra
um sistema que acolha essa vontade de ter um parto normal”. 

De acordo com dados da Secretaria
Municipal da Saúde de São Paulo, dos 169.350 bebês nascidos vivos na rede
municipal em 2017, cerca de 17,7 mil eram prematuros, ou seja, nasceram com
menos 37 semanas de gestação.


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